“Ajuda” escuta-se no chilrear
O canto lança o pedido de ajuda! Não consegue encontrar botões florais, frutos moles nem esporângios de fetos nativos dos Açores, para se alimentar. Estávamos em 2003.
“Criticamente em perigo de extinção”, o Priolo, pássaro açoriano com lar na zona leste da Ilha de São Miguel. É aqui, na área mais montanhosa da ilha, que se situam as Terras do Priolo, nos Municípios de Nordeste e Povoação.
Por entre a bruma, o sinal de alerta foi dado!
A redução das áreas de floresta Laurissilva e a degradação das mesmas, pela presença de Espécies Exóticas Invasoras (EEI), provocou uma redução drástica na base alimentar deste pequeno pássaro.
Esta rara e curiosa espécie de ave encontra em S. Miguel paisagens de tirar o fôlego, como a Lagoa das Furnas, as fumarolas, piscinas naturais e até mesmo penhascos costeiros. Encontra também símbolos dos primeiros povoadores europeus nos Açores, o farol do Armel, o mais antigo no arquipélago e algumas das igrejas mais ancestrais. Mas nas turfeiras do Planalto dos Graminhais, na Floresta Laurissilva da Serra da Tronqueira e do Pico da Vara, o ponto mais alto da ilha, o Priolo não encontra o que mais precisa: comida!
Sente-se ameaçado, não é para menos!
Intervenção em marcha
Continua a cantar, a pedir por uma intervenção rápida!
Vieram reforços de vários lados. Eis que surge o projeto de salvação, LIFE Priolo, coordenado pela Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves (SPEA), com o financiamento da Comissão Europeia e o cofinanciamento do Governo dos Açores. Foco da intervenção: proteger e recuperar um conjunto mais amplo de espécies, ao restaurar habitats prioritários dos Açores, como a Floresta Laurissilva e as turfeiras.
Nos primeiros cinco anos, as equipas da LIFE Priolo, focaram-se sobretudo nas áreas melhor conservadas. Foi incisiva esta intervenção. 205 hectares de Floresta Laurissilva recuperada.
A partir de 2009 a aposta foi para o restauro ecológico de habitats prioritários, áreas de menor altitude com maior ocupação de espécies invasoras arbóreas, como o incenso - Pittosporum undulatum, assim como o restauro de turfeiras no Planalto dos Graminhais, relevantes para o equilíbrio do ecossistema e para o fornecimento de serviços relacionados com a regulação do ciclo hidrológico. Mais de 52 hectares de Floresta Laurissilva e Matos Macaronésicos, e 99 hectares de turfeiras juntam-se à área já recuperada.
A aposta mais ambiciosa só surgiu em 2013. Uma área de 24 hectares, com uma diferença de altitude entre a base e o topo de cerca de 600 metros, teve uma recuperação que permitiu uma maior disponibilidade alimentar para o Priolo.
Foi intervencionada também uma linha de água de 4 hectares e uma faixa de cumeada de 70 hectares na envolvente da Reserva Natural do Pico da Vara. No total foram intervencionados 98 hectares de Floresta Laurissilva e Matos Macaronésicos.
20 anos a proteger o Priolo
O canto agora é de alívio. Os anos passam, mas os trabalhos continuam.
As próximas ações pretendem recuperar mais 160 hectares de Floresta Laurissilva, Matos Macaronésicos e turfeiras de altitude. Ações de planeamento e intervenção dos habitats naturais e a capacitação da população, tem sido o garante do lar do Priolo.
Melhorar de forma integral a gestão do espaço que inclui planeamento, replicação de ações, avaliação dos benefícios socioeconómicos dos projetos, promoção do turismo sustentável e educação ambiental são linhas estratégicas do presente, a replicar no futuro.
Certificação FSC como ferramenta para a conservação do Priolo
A incorporação das boas práticas florestais tem feito parte da estratégia desde o início do projeto LIFE Priolo. Se o lar desta pequena ave for devidamente gerido, então a sua sobrevivência está garantida.
“O que nos levou a avançar para a certificação FSC, passou por uma questão de credibilidade e de dar o exemplo de uma gestão florestal que nós queremos para a região e para o setor privado” refere Vasco Medeiros, dos Serviços Técnicos de Desenvolvimento Florestal do Governo dos Açores. Acrescentando ainda: “Esta certificação é importante pela capacidade organizacional que trouxe à Direção Regional e também pela salvaguarda de outros valores a nível de conservação e a nível ambiental.”
O processo de certificação FSC do perímetro florestal e matas regionais da Ilha de São Miguel, iniciado em 2014, pelo Governo dos Açores – Direção Regional dos Recursos Florestais (DRRF), reforçou a importância da conservação e gestão das áreas de florestas de proteção.
A incorporação dos princípios do FSC na gestão e exploração das áreas de produção de Cryptomeria japonica deste perímetro, por parte da DRRF, tem impactado positivamente os povoamentos existentes, com a instalação de vegetação endémica especialmente ao longo das linhas de água, criando corredores ecológicos, potenciais novos habitats para o Priolo.
O Priolo já respira alguma segurança
“Conseguimos salvar o priolo de extinção, sendo este um caso de sucesso a nível mundial” acrescenta Rui Botelho, da SPEA.
A sua dieta diária pode ser avistada do lugar onde mora. Deixou de ser uma ave “criticamente em perigo de extinção” para “vulnerável”.
350 hectares de Floresta Laurissilva e 99 hectares de turfeiras recuperadas, 21 empregos criados, 85% do orçamento investido em empresas locais, melhoria dos Serviços de Ecossistemas, ações de educação ambiental com mais de 10 mil pessoas da comunidade local e 30 mil alunos sensibilizados para a causa Priolo, são os resultados desta intervenção.
As Terras do Priolo, galardoadas pela Carta Europeia para o Turismo Sustentável, em 2012 e 2016, contam com 47 empresas do setor como parceiros para a conservação desta espécie.
Priolo é agora uma marca da região!
O Priolo agradece.
Com o apoio da Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves (SPEA) e da Direção Regional dos Recursos Florestais do Governo dos Açores (DRFF).